Por Gabriel Costa, especial para o Fringe
O poder da arte está em encontrar a beleza no cotidiano. Com olhar generoso, uma viagem pode se transformar em poesia e nos levar além das nossas memórias. Em Aos Companheiros de Estrada, somos companheiros de viagem de Camila pelos caminhos que inspiraram Guimarães Rosa a escrever Grande Sertão: veredas.
A peça está em cartaz no Miniauditório Glauco Flores de Sá Brito, no Teatro Guaíra, em Curitiba, até o dia 20 de julho, de quinta à sábado às 20h; domingo às 19h. A entrada é gratuita, com retirada de ingressos uma hora antes de cada sessão.
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A inspiração para o espetáculo partiu da vivência da própria atriz, que percorreu 189 km pelos Caminhos do Sertão, assim como a personagem que interpreta. Estreada em 2023, a peça é fruto de uma parceria entre Camila Ferrão e o diretor Victor Lucas Oliver, nascida da pesquisa desenvolvida no curso “Estado de Ser do Ator”, do LUME Teatro.
Logo no início, o espetáculo revela a virtude da musicalidade. A jornada da protagonista nunca é solitária, mas guiada por canções que traduzem seus sentimentos e os encontros vividos ao longo do percurso.
Ao seu lado, caminham dois homens. Mais do que personagens, parecem vozes de sua consciência, surgindo entre o que ela vê e o que sente. São eles que a encorajam a seguir, mesmo quando o cansaço ameaça vencê-la.
Entre as passagens do espetáculo, destaca-se a atenção dada às questões climáticas, e como elas afetam, de forma ainda mais cruel, o sertão e seus habitantes. Mesmo sendo uma turista naquele ambiente, Camila vê um lado que não é comumente retratado na mídia.
Poesia em Movimento
Acima de tudo, Aos Companheiros de Estrada é poesia em movimento. A jornada é permeada por reflexões sobre a vida, a natureza e o futuro do mundo. Uma delas, sobre os pés e sua relação com quem somos, é especialmente marcante.
Na peça, um pé sujo, com calos ou unhas caídas, não é apenas uma questão de saúde: é símbolo de existência, de caminhada e de tudo que nos atravessa.
A montagem e o figurino da peça são simples, mas cumprem seu papel com precisão e delicadeza. O vestido usado por Camila e as camisas dos dois homens trazem detalhes sutis, que nos transportam para um outro Brasil — mais interiorano, sensível e atemporal.
Ao longo de toda a peça, Camila se movimenta na frente de pedaços de papel, que mudam de cor conforme a incidência da luz. A técnica cria um efeito visual potente, sobretudo por estar sempre em sintonia com os sentimentos da protagonista e com os temas evocados em cena. A luz, ali, é expressão emocional, paisagem simbólica e extensão da própria narrativa.
Ser um companheiro de estrada de Camila é enxergar o Brasil — e suas muitas faces — com sensibilidade. É embarcar numa jornada musical, reflexiva e, acima de tudo, profundamente brasileira.
A maior prova do poder da obra de um artista está no tempo. Guimarães Rosa continua inspirando seus leitores a olhar para o outro lado da realidade.
Aos Companheiros de Estrada é um brinde àquela força que transforma uma viagem em algo capaz de se conectar com diferentes pessoas, com diferentes histórias, em diferentes lugares. E que mais pessoas possam se encontrar neste Grande Sertão.
Nossa, Fui assistir na quinta e… putss MUITO BOM!
Foi uma alegria assistir o talento desses atores maravilhosos, sob a direção de Victor Lucas Oliver. Uma peça linda e emocionante. Quem ainda não assistiu, aproveitem. Parabéns e muito obrigada por tamanha entrega!