O Museu do Ipiranga inaugura no dia 25 de novembro a exposição “Debret em questão – olhares contemporâneos”, que propõe um diálogo entre a iconografia do Brasil Império criada por Jean-Baptiste Debret (1768–1848) e sua releitura crítica por 20 artistas contemporâneos. A mostra é um dos destaques da Temporada França–Brasil 2025 e tem entrada gratuita.
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Quase todas as imagens que sobreviveram do Brasil colonial e imperial vieram das aquarelas de Debret, o francês que desembarcou no país em 1816 com a Missão Artística Francesa.
Durante 15 anos, registrou o cotidiano de uma sociedade sustentada pelo trabalho escravizado. Suas obras, reunidas em Viagem pitoresca e histórica ao Brasil (1834–1839), misturam olhar científico e sensibilidade estética, sem suavizar a violência que sustentava a vida no Rio de Janeiro imperial.
Releituras e disputas simbólicas
Com curadoria de Jacques Leenhardt e Gabriela Longman, a mostra apresenta 35 pranchas litográficas originais e um conjunto de obras que revisitam o olhar de Debret como campo de disputa histórica. “Trabalhos de artistas como Gê Viana, Dalton Paula e Isabel Löfgren & Patricia Goùvea desarmam a violência vivida para tornar possível a escrita de uma outra história, marcada agora pela autoestima e respeito”, observa Leenhardt.
Entre os destaques estão duas obras inéditas. Jaime Lauriano apresenta Brasil através do espelho, instalação que tensiona presente e passado ao tratar de etnocídio, apropriação cultural e racismo estrutural. Já Rosana Paulino exibe Paraíso Tropical, tríptico em técnica mista que desmonta o imaginário do Brasil como paraíso idílico para revelar o extrativismo e as marcas do colonialismo.
A força de um registro incômodo
Ao retratar o trabalho forçado, os castigos e a vida cotidiana dos negros escravizados, Debret rompeu com o exotismo romântico e aproximou-se de uma visão quase antropológica. Na época, o conjunto foi rejeitado pelo governo brasileiro por expor a crueldade da escravidão. Mais de um século depois, suas imagens foram revalorizadas e reproduzidas em livros escolares, objetos e mídias, muitas vezes descontextualizadas, sem o olhar crítico do artista.
“Quando as gravuras de Debret se separaram do texto original, elas passaram a cumprir uma função nostálgica dos tempos da escravidão — reflexo de uma sociedade que ainda cultiva a violência”, explica Paulo Garcez Marins, diretor do Museu Paulista da USP.
Olhares do presente
A mostra reúne nomes como Anna Bella Geiger, Denilson Baniwa, Sandra Gamarra, Tiago Gualberto, Val Souza, Eustáquio Neves e Laercio Redondo, em obras que utilizam pintura, fotografia, vídeo, instalação e colagem digital. Há também uma sala dedicada ao desfile da escola Acadêmicos do Salgueiro de 1959, inspirado em Debret, com registros do fotógrafo Marcel Gautherot.
Para Marins, “as exposições recentes do Museu do Ipiranga buscam interpretar o passado com as perguntas do presente — é assim que o pensamento histórico se mantém vivo e necessário”.
Debret em questão – olhares contemporâneos
Curadoria: Jacques Leenhardt e Gabriela Longman
Onde: Museu do Ipiranga – Sala de Exposições Temporárias
Quando: De 25 de novembro de 2025 a 17 de maio de 2026
Horário: Terça a domingo, das 10h às 17h (última entrada às 16h)
Quanto: Entrada gratuita
A mostra integra o calendário da Temporada França–Brasil 2025, que celebra os 200 anos de relações diplomáticas entre os dois países.
