Por Gabriel Costa, especial para o Fringe
Em 1943, no auge da Segunda Guerra Mundial, a cidade de Birmingham, na Inglaterra, foi abalada pela descoberta de um corpo escondido dentro da cavidade de um olmo, próximo a uma área residencial.
A identidade da vítima, conhecida apenas como Bella, permanece um mistério até hoje, alimentando teorias que vão de espionagem britânica a rituais de bruxaria e transformando o caso em um dos enigmas mais célebres da história criminal inglesa.
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A investigação, cheia de lacunas, deixou a população cercada por perguntas sem resposta, enquanto a frase “Who put Bella in the Witch Elm?” se espalhava entre moradores e jornais.
Mais de 70 anos depois, o enigma inspirou um grupo de jovens gaúchos e acabou batizando uma banda de rock alternativo: Bella e o Olmo da Bruxa. Em atividade desde 2016, o quarteto formado por Pedro Acosta, Felipe Pacheco, Júlia Garcia e Ricardo de Carli vem se destacando na cena nacional com influências do emo e do indie rock e letras de tom confessional e catártico.
Apesar da origem sombria do nome, o som da banda está longe disso.
“Quem encontrou essa história foi a Júlia, lá no começo da banda, em 2016, quando ela e o Lipo estavam meio desesperados atrás de um nome. Ela acabou achando essa matéria na internet. Mas a verdade é que — infelizmente ou felizmente — o nome tem muito pouco a ver com a banda. Ele soa até como algo meio sombrio, meio de terror, e comunica pouco com o que a gente faz. Ainda assim, acho um nome bom”, conta Pedro Acosta, vocalista do grupo.
O álbum de estreia, lançado em 2020 e batizado com o próprio nome da banda, marcou a entrada do grupo no cenário independente. Dele saiu o maior hit da carreira até agora, “Neon Genesis Evangelion II”, uma súplica a um amor perdido que ultrapassou 1,5 milhão de reproduções no Spotify.
Pedro conta que algumas das músicas escritas no primeiro álbum remontam à sua adolescência, o que explica o tom mais melancólico do projeto. “Eu acho aquele disco muito legal, tem muita coisa boa ali.
Mas, olhando hoje, dá pra ver que a gente ainda estava um pouco preso às nossas referências de quando eu tinha 15, 16, 17 anos — que foi justamente a época em que muitas daquelas músicas foram compostas”, afirma o artista.
Afeto e Outros Esportes de Contato
O álbum de estreia ainda rendeu a primeira turnê do grupo, em 2024, quando o quarteto levou suas músicas a cidades entre Porto Alegre e Belo Horizonte. Foi após essa experiência na estrada durante a gravação do segundo disco, Afeto e Outros Esportes de Contato — lançado em agosto de 2025 — que a banda atingiu seu auge artístico até agora.
Segundo o vocalista Pedro Acosta, o disco foi profundamente influenciado pelo hábito de tocar constantemente em diferentes lugares e condições, o que fortaleceu a relação entre os integrantes e o amadurecimento sonoro do grupo.

Diferente do trabalho anterior, o novo álbum aposta em experimentações de gênero, letra e arranjo. Do indie melancólico característico da banda a um pagode ousado que encerra o disco, Afeto e Outros Esportes de Contato reflete a amplitude de gostos musicais dos quatro integrantes, que transitam com naturalidade entre o pop e o experimental.
Pedro conta que o grupo se permite uma liberdade total de criação e que a inclusão do pagode — um dos momentos mais controversos do disco — surgiu justamente dessa vontade de fazer o que achavam interessante, sem medo da reação do público.
Mesmo após a turnê, Porto Alegre e sua cena musical ainda cumpriram um importante papel de influência no som do álbum. Em especial, destacam-se bandas como Júpiter Maçã e Cachorro Grande.
“Eu diria que a gente é um eco das coisas que aconteceram em Porto Alegre.”

O título do álbum parte da ideia de afeto como contato, nem sempre harmonioso. A banda trabalha o conceito de que o amor também se manifesta nos atritos e nos conflitos emocionais, traduzindo essas tensões em letras e arranjos que alternam delicadeza e ruído.
Com pouco mais de dois meses de lançamento, o álbum já acumula mais de 700 mil reproduções no Spotify e vem consolidando o grupo em um novo patamar. “É meio paradoxal a pessoa ter uma relação tão grande com o nosso trabalho, com a minha voz, e a gente nem se conhecer”, reflete Acosta.
O processo criativo por trás do álbum nasceu de algo profundamente íntimo. As letras e ideias iniciais geralmente partem de Acosta e de Lipo (Felipe Pacheco), ambos guitarristas e vocalistas da banda. As músicas costumam surgir de maneira simples, no formato voz e violão, em momentos domésticos e despretensiosos.
A partir dessas primeiras ideias, o trabalho se torna coletivo. Ricardo De Carli (bateria) e Júlia Garcia (baixo) ajudam a desenvolver os arranjos, que têm a função de expandir e dar corpo à emoção inicial.
O sucesso de Afeto e Outros Esportes de Contato também veio da crítica: o álbum rendeu à Bella e o Olmo da Bruxa o Prêmio Açorianos de Música, concedido pela Secretaria de Cultura de Porto Alegre, na categoria Artista Revelação. Mais do que um reconhecimento, o disco marca o amadurecimento musical do quarteto e reforça a identidade experimental que vem destacando o grupo na cena alternativa brasileira.
O futuro
Ao ser perguntado sobre o futuro da banda, Pedro Acosta disse:
“Eu quero dizer tudo que a gente ainda não disse.”
E é por isso que Bella e o Olmo da Bruxa já acumula tantos fãs. Às vezes, tudo que o público quer é alguém para se identificar. Pedro, Felipe, Ricardo e Júlia são mais que apenas artistas — são fiéis companheiros que dizem tudo aquilo que milhares de pessoas queriam dizer.
“Tem coisas que eu canto nas músicas que eu provavelmente teria vergonha de falar pra qualquer amigo. Mas eu canto pra centenas de pessoas que eu nem conheço.”
Existem bandas que fazem o público se sentir visto, ouvido e entendido; uma vida em que não se está mais sozinho. Bella e o Olmo da Bruxa é uma delas.
