Do alto da minha experiência sobre lerdos escoamentos de multidões – há sempre algo de bovino e fluvial nesse movimento – estimo que cerca de 60% do público deixou o Rio Jazz Fest por volta das 22h30 de ontem (13), na Marina da Glória, no Rio de Janeiro, logo após o encerramento do show de Alceu Valença.
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Não é a primeira decisão coletiva que lamento em nome dos que a tomaram. Pior para quem partiu, pois quem ficou presenciou um histórico encontro entre Marcelo D2 e Marcos Valle. Talvez, os dois artistas vivos mais importantes de suas respectivas gerações. Dois caras que contribuíram decisivamente para moldar a cara da música brasileira no mundo.
D2 subiu ao palco antes, com o show de seu projeto com o trio Samba Drive. Uma superbanda de samba jazz com a qual anunciou que vai lançar um álbum em novembro, em Londres. Ele fez seu set inicial com alguns de seus maiores hits sobre o som envolvente do pianista argentino Pablo Lapidusas, do baixista Mauro Berman e do baterista Lourenço Monteiro.
Em busca do groove perfeito
Se em suas rimas e versos, D2 sempre se abasteceu das melhores referências dos compositores populares brasileiros, de uns bons anos para cá, ele tem sofisticado cada vez mais a música sobre a qual dá seu recado. E na medida em que os anos passam sua prosódia fica cada vez melhor assentada em um tipo de música instrumental brasileira cujo grande nome, exemplo e guia é o próprio Marcos Valle.
Talvez por isso é que no intervalo dos temas, Marcelo Maldonado Gomes Peixoto não se cansava de repetir sobre o quanto estava genuinamente emocionado por receber seu ídolo. “Uma noite dessa era um sonho impossível quando eu comecei: tocar num festival de Jazz no Rio com Marcos Valle”, disse.
Os dois, na verdade, já haviam dividido o palco no ano passado, durante o show de comemoração de 80 anos de Valle no Circo Voador. D2 explicou que ele Valle são amigos há cerca de 30 anos, ou seja, um pouco antes do Planet Hemp samplear a canção Mentira, de Marcos Valle, na faixa Contexto, do álbum A Invasão do Sagaz Homem Fumaça, de 2000.
Batucada Estrelar
Marcos Valle subiu ao palco exatamente às 23h30. Com seu proverbial cabelo platinado esvoaçante, vestia uma jaqueta da banda punk escocesa Exploited (não sei responder como isso aconteceu). Sentou e atacou, um por um, os seus muitos clássicos como “Azymuth”, “Samba de Verão”, “Batucada” e “Estrelar”, entre outras pedradas.
Luiza Machado e Patrícia Valle, respectivamente das companheiras de D2 e Valle, subiram ao palco para completar as harmonias vocais e mandaram muito bem. Como sói acontecer em shows de D2, o público via e ouvia “estupefaciado”, mas ninguém parecia estar se divertindo tanto quanto o rapper que circulava pelo palco como um anfitrião que recebe um amigo pianista em casa.
E, por sorte, este amigo é gênio maior do seu instrumento e da composição. Com seu piano em alta amperagem, Valle é certamente o artista brasileiro mais cool e, talvez, o mais venerado no cenário internacional. Em um festival em que a ideia era promover encontros, este que uniu D2, Valle e o pessoal do Samba Drive pode fácil ser chamado de histórico. Além de surpreendente e bem-vindo, como o vento que varreu as nuvens para longe da baía quando a festa acabou no começo da madrugada.