De Mirela Costa do Jornal da USP
Antes mesmo de Tropicália (1968), a canção-manifesto de Caetano Veloso, se popularizar país afora e do tropicalismo tomar o cenário cultural brasileiro, o artista plástico Hélio Oiticica (1937-1980) já trabalhava em torno dos ideais artísticos de vanguarda que marcaram a década de 1960. Ele próprio criador da palavra “Tropicália”, termo que nomeia sua obra na mostra Nova Objetividade Brasileira, de 1967, Oiticica se consagra como uma das maiores personalidades da contracultura e do neoconcretismo no Brasil. Ao propor a arte como uma experiência a ser vivenciada – e não somente contemplada –, ele convida o espectador a se tornar participante de suas obras.
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A partir do pioneirismo de Oiticica no panorama artístico brasileiro, a Editora da USP (Edusp) lançou recentemente Manifestações Ambientais, de Hélio Oiticica, da coleção Prismas, voltada a propor estudos aprofundados sobre obras de arte nacionais e internacionais. No livro, os autores Paula Braga e Celso Favaretto se desdobram sobre uma sequência de obras que Oiticica categorizou como Manifestações Ambientais, com destaque para a análise de Tropicália (1967) e Éden (1969).
Ambos são estudiosos de longa data da arte de Oiticica. Favaretto – professor aposentado da Faculdade de Educação (FE) da USP – escreveu A Invenção de Hélio Oiticica (1992), publicado pela Edusp, um dos primeiros estudos sobre o artista no Brasil. O autor amparou os estudos de Braga, inclusive orientando-a em seu doutorado em Filosofia pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, em 2007. A autora lançou também Hélio Oiticica: Singularidade, Multiplicidade (Perspectiva, 2013), que aborda a arte de Oiticica a partir da década de 1970.
“A obra de Oiticica vai se desenvolvendo a partir do movimento, da ideia de envolver, de criar um ambiente ou um espaço estético para interferir na subjetividade e no comportamento daquele espectador, que então vira um participador”, afirma Paula Braga em entrevista ao site da Edusp. Nascido no Rio de Janeiro em 1937, Hélio Oiticica iniciou seus estudos artísticos no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio) como aluno do Curso Livre de Pintura de Ivan Serpa, em 1954. O artista participou do Grupo Frente, entre 1955 e 1956, e foi um dos signatários do Manifesto Neoconcreto, em 1959. A partir de então, estabeleceu o corpo como o ponto central de sua obra, de forma a transformar o cotidiano em expressão artística e apontar uma relação entre arte e vida.
No livro, Braga e Favaretto acompanham a formulação do principal projeto idealizador por trás dos trabalhos do artista: o Programa Ambiental. Oiticica desenvolveu e aprofundou seu programa à medida que se aperfeiçoou como artista, desde suas pinturas neoconcretistas – nas quais pregava pelo “fim do quadro”, como ele dizia – até suas maquetes e exposições, em que sugeria a superação dos modelos tradicionais de arte por meio da interatividade e da ambientação do espectador nas obras. “Oiticica diz que a pintura deixa de ser o quadro. Ela tem que estar em outro lugar, em um espaço geral. E se ela está no espaço, pode se movimentar. Isso é a introdução do tempo na pintura, um assunto inovador”, destaca Favaretto também em entrevista ao site da Edusp.
“A obra de Oiticica vai se desenvolvendo a partir do movimento, da ideia de envolver, de criar um ambiente ou um espaço estético para interferir na subjetividade e no comportamento daquele espectador, que então vira um participador”, afirma Paula Braga em entrevista ao site da Edusp. Nascido no Rio de Janeiro em 1937, Hélio Oiticica iniciou seus estudos artísticos no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio) como aluno do Curso Livre de Pintura de Ivan Serpa, em 1954. O artista participou do Grupo Frente, entre 1955 e 1956, e foi um dos signatários do Manifesto Neoconcreto, em 1959. A partir de então, estabeleceu o corpo como o ponto central de sua obra, de forma a transformar o cotidiano em expressão artística e apontar uma relação entre arte e vida.
No livro, Braga e Favaretto acompanham a formulação do principal projeto idealizador por trás dos trabalhos do artista: o Programa Ambiental. Oiticica desenvolveu e aprofundou seu programa à medida que se aperfeiçoou como artista, desde suas pinturas neoconcretistas – nas quais pregava pelo “fim do quadro”, como ele dizia – até suas maquetes e exposições, em que sugeria a superação dos modelos tradicionais de arte por meio da interatividade e da ambientação do espectador nas obras. “Oiticica diz que a pintura deixa de ser o quadro. Ela tem que estar em outro lugar, em um espaço geral. E se ela está no espaço, pode se movimentar. Isso é a introdução do tempo na pintura, um assunto inovador”, destaca Favaretto também em entrevista ao site da Edusp.
No livro, os autores dão destaque especial para Tropicália (1967) e Éden (1969), que ganham capítulos de análise particulares devido à centralidade que ocupam no projeto experimental de Oiticica. Ainda que o Tropicalismo – movimento de contracultura e valorização dos elementos populares da cultura brasileira impulsionado por Gilberto Gil e Caetano Veloso –, tenha ganhado projeção nacional, Favaretto reitera que “não existia tropicalismo quando Oiticica fez o ambiente que ele chamou de ‘Tropicália’”. Ao elaborar uma espécie de labirinto de madeira forrado com areia e pedras, que, percorrido pelo espectador, colocava-o em contato corporal com diversos elementos naturais e culturais do Brasil, o artista chamou-o de Tropicália.
“Primeiro, o Oiticica faz a obra e dá a ela esse nome. Então, o cineasta Luiz Carlos Barreto sugere ‘Tropicália’ como título para uma música que o Caetano compôs. Barreto fala sobre o Hélio Oiticica, diz que ele fazia obras parecidas com a música do cantor, e o Caetano intitula a canção dele ‘Tropicália’. A partir disso, surge na música popular brasileira o tal do tropicalismo”, conta Braga. Favaretto ainda aponta a coexistência de elementos populares e da cultura de massa brasileira tanto na canção, como na obra do artista. “Ambas formam uma imagem do Brasil”, afirma ele, também autor de Tropicália: Alegoria, Alegria (1979), importante análise sobre o movimento. Por meio da combinação entre abertura estrutural, ação no ambiente, crítica da arte e intervenção cultural, a Tropicália de Oiticica questiona as interpretações culturais então hegemônicas no país e ressalta a relação entre arte e política.
Contrário ao caráter de consumo assumido pelo movimento tropicalista – “burgueses, subintelectuais, cretinos de toda a espécie a pregar tropicalismo, tropicália (virou moda!) […]”, como diz em escritos de 1968 –, Oiticica desenvolve Éden sob a tentativa de afastar a arte do consumismo, aproximando-a das vivências humanas e das experiências sensoriais. A obra, então, é composta por uma instalação com diferentes ambientes que estimulam os sentidos e convida o participante a explorar, tocar, deitar, caminhar e interagir com materiais naturais, como areia, água, folhas e pedras, além de objetos como almofadas e estruturas geométricas. O artista propõe um espaço de liberdade e contemplação, onde as pessoas vivenciam um estado de experimentação e ludicidade. “No Éden, diferentemente de Tropicália, não há imagens a serem decifradas ou decodificadas, mas um espaço de circulação, de sensações, imaginação e ideias”, relatam os autores no livro.