Chico tem 64 anos e já passou 10 dias preso num aquário no centro de Curitiba. Aos 75 anos, Nautílio sonha construir um retiro para seus colegas artistas se aposentarem. Nas últimas semanas, ele tem conversado com o fantasma do ator Emílio Pitta sobre o assunto.

Dona Mide é a griô da turma. Foto: Annelize Tozetto

Dona Mide, 87, é a griô da turma. Quando ela fala, todos ouvem. E ninguém sabe de fandango como colega. Gina Enegita nasceu na escola de samba. Seu coração bate assim: Bum Bum Paticumbum Prugurundum.

Issao Omoto tem certa propensão a arrumar encrenca, mas, em momentos de ternura, canta Frank Sinatra em japonês. Tita Coty é uma “poeta do otimismo aos 78 anos. Chica Merlo, 64, gosta de cantar” e Maria Resch, 80, disse que ganhou uma nova família.

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Estes são apenas oito nomes dos 26 atores – 30% do elenco – do espetáculo A Velocidade da Luz, reunidos em Curitiba há pouco mais de um mês pelo diretor argentino Marco Canale, de 47 anos.

Desde que entraram de cabeça no projeto, a equipe se comporta como uma gangue circulando, cantando, dançando juntos pela cidade 300 mil quilômetros por segundo. Até um churrasco de fogo com chão já rolou.

Elenco do espetáculo a 300 mil/km por hora. Foto: Annelize Tozetto

A escolha de A Velocidade da Luz como o espetáculo de rua que fecha o Festival de Curitiba, com duas sessões no sábado e no domingo sempre às 16h, em um movimento pelas ruas centrais de Curitiba que começa na Praça Santos Andrade não foi por acaso.

A peça conecta muitas pontas da curadoria planejada para esta edição:
a) o espetáculo faz parte do eixo latino de peças do Cone Sul do continente;
b) trata de temas do envelhecimento como outros espetáculos da grade;
c) experimenta formas e possibilidades inovadoras com outras tantas;
d) um espetáculo de rua como as centenas que fazem a força do Fringe, na grade da Mostra Lucia Camargo.

Com seu elenco de atores e não atores, Canale explora as belezas e as mazelas da região central de Curitiba em um jogo que repete com as potencialidades e fraquezas de cada um dos atores.

“O que entra no coração, fica e não vai mais”, diz o diretor Marco Canale. Foto: Annelize Tozetto

E encontro das memórias e referências biográficas de cada um dos atores cria um mosaico único e efêmero, vai acontecer duas vezes, e nunca mais, mas dificilmente será esquecido.

“O que entra na cabeça, da cabeça vai embora.
O que entra no coração, fica e não vai mais”, costuma dizer o diretor citando o poeta do folclore argentino Atahualpa Yupanqui.

Durante a entrevista coletiva no Hotel Mabu, Canale, que já levou o projeto a outras 10 cidades em três continentes, disse que há pontos comuns em todos os lugares. Como o movimento do campo para a cidade, que a maior parte dos atores idosos experimentou na infância. A fé de que a vida não seja isso que se vê. E que todos nos reencontraremos um dia e, como diz a velha canção, que seja num dia de sol.

Elenco tomou de assalto as ruas de Curitiba. Foto: Annelize Tozetto

Aliás, a grande preocupação agora parece ser em relação ao tempo: vai chover ou não? E quanto e quando? E convenhamos, nada é tão curitibano como isso.

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Sandro Moser é jornalista e escritor.

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