“Toda cidade que se preze tem a sua banda de rock”, costuma dizer um amigo. Em Curitiba temos a Relespública. A banda foi formada pelos adolescentes Fabio Elias (guitarra), Emanuel Moon (bateria) e Ricardo Bastos (baixo), no final da década de 1980.
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De lá para cá, a Reles cumpriu uma trajetória sem igual na cena nacional do rock. Desde sempre influenciados pelo rock britânico dos anos 1960, em especial pelo The Who, a banda incorporou também a estética do mod, a partir da entrada do vocalista Daniel Fagundes, em 1993. Daniel morreu em um acidente de carro em 1994, no momento mais difícil da trajetória cheia de altos e baixos da banda.
Trinta anos depois da tragédia, a Relespública passa por uma segunda pesada mudança estrutural. O baixista Ricardo Bastos, pilar da formação original, pediu para sair da banda há cerca de dois meses, e em seu lugar assumiu Raphael Machado, ex-baixista da banda Dissonantes.
Depois de um grande show no sábado (12), em Francisco Beltrão, no interior do Paraná, a nova formação da Reles toca hoje, domingo (13), Dia Mundial do Rock, no The Bowie, em Curitiba. A casa abre às 15h. Fabio Elias falou com o Fringe sobre o momento de mudança na Reles e sobre por que não desiste do rock.
ENTREVISTA COM FABIO ELIAS

Como a banda lidou com a saída do Ricardo depois de 35 anos?
Cara, quando o Ricardo Bastos anunciou em um áudio que estava fora, eu estava no aniversário do [baterista] Ivan Rodrigues, e o Rafael Machado [baixista da banda Dissonantes] estava do meu lado, na mesma festa. A hora que eu terminei de ouvir, eu olhei pra ele e perguntei se ele encarava, e ele falou: “Fábio, conte comigo, meu sonho sempre foi tocar na Relespública. Se vocês precisarem de mim, eu tô à disposição”.
Um cara que já tinha substituído o Ricardo quando ele teve um acidente e quebrou o braço, e não pôde tocar por um tempo. O Rafa ficou com a gente então não tinha melhor pessoa pra entrar na banda e formar o trio com a gente. Ele veio pra somar e multiplicar tudo que a gente já vem fazendo há muitos anos.
Acho que já estava tudo escrito, então não dá para chamar de difícil essa readaptação a uma nova formação. O Ricardo tinha que seguir pra vida dele — já faz um tempo que ele estava querendo se desligar. Já não estava tão presente nas decisões e opiniões internas da banda, e a gente sempre respeitou a decisão de todos ali. Não é um quartel-general, é uma banda. O cara pode sair quando quiser, e, se quiser, pode voltar. Mas só não pode perder a essência da coisa.
Eu conheço o Ricardo desde criança, ele foi meu primeiro amigo de infância. A gente cresceu junto, tocou junto a vida inteira. Trinta e seis anos não são trinta e seis dias. Foram muitas lutas e batalhas juntos. Então foi sofrido. Fiquei triste, fiquei mal. Não vou mentir: eu não queria que o Ricardo saísse da banda. Mas a opção foi dele, a escolha foi dele. E a vida é feita de escolhas. Eu não posso intervir na escolha de ninguém. Então, que ele seja feliz, seguindo o caminho dele, fazendo o que quiser fazer, onde ele for fazer. Que ele seja muito feliz. Mas agora a gente segue com o Rafa, também muito feliz e com uma energia nova.
Muda alguma coisa no som da Reles?
É sangue novo. O Rafa é um cara que traz as referências dele também. Ele tem um estilo um pouco diferente, até porque o Ricardo é um baixista único, né? Sempre foi excepcional no baixo. Mas o Rafa também é um puta músico. E o Rafa tem o plus de cantar. O Ricardo fazia os backings necessários, mas não cantava. E o Rafa canta. Então, nos shows com o Rafa, agora ele tem o momento de cantar, e eu fico mais solto, mais vivo na guitarra — que é uma coisa que eu sempre gostei de fazer. E a banda segue como um trio — sempre foi, desde o início. A história está escrita pra ser isso. E vamos respeitar a história. Precisamos respeitar a vontade das energias cósmicas.
Você gosta de dizer que o rock é música dos “inconformados para os incompreendidos”? Explica isso melhor?
Sempre foi, sempre será. Por mais que ele perca a força como a música do momento, da moda — ele nunca foi a moda, na verdade. Mesmo quando o rock era da época dos Beatles, dos Rolling Stones, dos anos 60, 70 — sempre tinha a música pop, a música tradicional, a música regional… O rock sempre foi correndo pelas veredas.
Sempre foi a música que tinha a distorção, a raiva, a energia, a incompreensão, a loucura. O rock sempre foi fora do establishment. Mas enquanto existir um jovem, um cara, uma garota inconformada, no fim, vomitando suas verdades para o mundo — ninguém vai deixar de ouvir uma banda de rock tocando. É assim que é.
E enquanto eu estiver andando sobre minhas pernas, com força, alinhando meus braços e com um fio de voz — eu estarei lá. Pra todos vocês curtirem, se divertirem, esquecerem um pouco dessa merda toda.