Por Gabriel Costa, especial para o Fringe 

No dia 14 de agosto, Milton Hatoum foi eleito para a cadeira 6 da Academia Brasileira de Letras, que tem como patrono o poeta Casimiro de Abreu. Romancista consagrado e autor de clássicos contemporâneos, ele é um dos grandes nomes da literatura brasileira das últimas décadas.

Milton Hatoum no Cine Guarani. Foto: Cido Marques

Cerca de um mês depois, no dia 12 de setembro, o III Festival da Palavra, em Curitiba, recebeu o escritor manauara para uma sessão especial do filme Retrato de um Certo Oriente, de Marcelo Gomes, inspirado em seu romance de estreia.
Sobre o filme, explicou a escolha por uma estrutura polifônica, feita de múltiplas vozes e perspectivas sem identificação explícita dos narradores — um grande quebra-cabeça literário.

Na sala escura do cinema, a conversa com o autor foi uma verdadeira aula sobre livros, leitura e literatura. Arquiteto de formação, Hatoum comparou a construção de seus livros a um projeto arquitetônico: “primeiro o conjunto, a forma e o entorno, depois as partes”.

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Desde 1989, quando publicou seu primeiro romance, Hatoum lançou oito livros — número cauteloso para um escritor de sua importância. Ele atribui o próprio ritmo ao seu método: prefere esperar o tempo agir sobre a memória antes de transformá-la em ficção. Para ele, escrever sobre acontecimentos recentes levaria a um “realismo brutal”, enquanto o distanciamento temporal permite refletir sobre experiências e transformá-las literariamente.

Hatoum também refletiu sobre as diferenças entre conto e romance, evocando Cortázar e Quiroga e citando a referência local: “Bom, e vocês têm aqui o Dalton Trevisan, que é o mestre do conto no Brasil.” Confessou ainda ter contos inéditos guardados, mas sem pressa de publicá-los. “O conto vence por nocaute, enquanto o romance vence por pontos”, disse. Para ele, o primeiro se caracteriza pela intensidade e brevidade e, até por isso, reconhece, prefere o romance, por lhe permitir desenvolver conflitos de forma mais ampla ao longo dos anos.

O escritor autografa seus livros em Curitiba. Foto: Cido Marques

Sobre as adaptações de seus romances para cinema e séries — incluindo Dois Irmãos, Relato de um Certo Oriente, Órfãos do Eldorado e contos de Cidade Ilhada — Hatoum comentou que não interfere nos roteiros, reconhecendo que literatura e cinema possuem linguagens distintas. Ele destacou as diferenças entre a densidade polifônica de seus livros e a linearidade exigida pelas adaptações audiovisuais.

Apesar de ser um dos mais premiados escritores do Brasil, com três Jabutis na coleção, Hatoum ainda acredita que o maior prêmio são os leitores que, mesmo após 35 anos do lançamento de seu primeiro romance, continuam lendo suas obras:

“O maior prêmio são vocês, são os leitores. O tempo pode ser cruel com o livro. O Relato já fez 35 anos. Então, é um mistério, é um milagre que ainda tenha leitores. E agradeço muito aos leitores, às leitoras e também às professoras de literatura, professores que, na verdade, fazem uma leitura orientada da minha obra.”

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