Entre os dias 16 e 30 de outubro, a Mostra Internacional de Cinema em São Paulo será palco de uma das estreias mais aguardadas do ano: o documentário “Nova ’78”, dirigido por Aaron Brookner e Rodrigo Areias.

A produção, uma parceria entre a Pinball London (Reino Unido) e a Bando à Parte (Portugal), é mais que um filme — é uma cápsula do tempo que resgata a energia visionária da Nova Convention, encontro lendário realizado em Nova Iorque no final de 1978.

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O evento reuniu nomes fundamentais da cultura do século XX, como William S. Burroughs, Patti Smith, Frank Zappa, Allen Ginsberg, Laurie Anderson, John Cage, Philip Glass e Merce Cunningham. Após sua estreia mundial no Festival de Locarno, em agosto, onde foi recebida com entusiasmo pela crítica, a obra chega à Mostra SP consolidando-se como um dos documentários mais importantes da temporada. A exibição em São Paulo marca o início de sua circulação na América Latina, antes da estreia comercial no Brasil, prevista para 2026.

O eixo Burroughs

No coração de “Nova ’78” está a figura magnética de William S. Burroughs. Sua presença foi o centro em torno do qual a Nova Convention se estruturou. O escritor retornava aos Estados Unidos após mais de duas décadas no exterior, sendo celebrado como um ícone vivo da contracultura.

O filme recupera o discurso com que abriu o evento, além de suas interações com artistas e intelectuais, revelando não apenas o alcance literário de Burroughs, mas sua influência política e cultural. Suas visões distópicas — consideradas provocativas na época — ressoam hoje como leituras antecipadas dos dilemas contemporâneos.

Um arquivo redescoberto

Filmado originalmente em 16mm por Howard Brookner, com som direto de Jim Jarmusch, o material permaneceu perdido por décadas até ser restaurado. O resultado é um documento vibrante, que revisita um dos momentos mais intensos da contracultura americana e propõe reflexões sobre criatividade, política, liberdade e consciência coletiva.

A montagem mantém a rudeza do arquivo original, com bastidores e performances espontâneas. Para Rodrigo Areias, a força do filme está em sua fidelidade à energia do período: “A codireção foi um processo natural entre duas perspectivas que se complementavam facilmente. Minha preocupação era respeitar os autores das imagens e fazer um filme que, nos anos 1970 ou 1980, jamais poderia ter sido feito da maneira como é feito hoje.”

Da restauração à consagração

A parceria entre Brookner e Areias nasceu anos antes, durante a produção de Listen, premiado em Veneza. “Nos conhecemos durante a produção de Listen, e desde então tentamos desenvolver vários projetos juntos. Este surgiu naturalmente”, recorda Areias.

Brookner destaca o caráter épico da empreitada: “Poucas pessoas percebem o trabalho envolvido em restaurar um arquivo e mantê-lo relevante. Foram dez anos de digitalização, sincronização e catalogação, com doações, dívidas e recursos próprios.” Em 2022, o reencontro com 44 rolos negativos desaparecidos transformou o projeto: “Quando percebemos o que tínhamos nas mãos, a relevância era inegável.”

Com trilha original de The Legendary Tigerman, “Nova ’78” dá sequência ao trabalho de Brookner na preservação do legado de seu tio, Howard Brookner — iniciado com Uncle Howard (Sundance e Berlinale) e com a restauração de Burroughs: The Movie (1983).

A Mostra SP como plataforma global

A presença de “Nova ’78” na Mostra SP funciona como vitrine estratégica e marco simbólico. O festival — um dos mais importantes do mundo — consolida o longa como destaque da temporada e plataforma de lançamento na América Latina.

Além de “Nova ’78”, a produtora portuguesa Bando à Parte também competirá na Mostra com “Ontem à Noite Conquistei Tebas” e “San Simón”, reforçando sua relevância no cinema europeu contemporâneo.

Um filme essencial

Em meio a tantas estreias autorais, “Nova ’78” se destaca como uma obra de importância extrema. Mais que revisitar um encontro histórico, o documentário conecta passado e presente, lembrando que as distopias antecipadas por Burroughs e seus contemporâneos se tornaram parte da realidade atual. A energia de 1978 ressurge como alerta e inspiração, transformando o filme em um dos grandes títulos da Mostra SP 2025.

“Nova ’78”

Direção: Aaron Brookner e Rodrigo Areias
Estreia comercial no Brasil: 2026

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Sandro Moser é jornalista e escritor.

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