No último sábado (11), a Cinemateca Capitólio, em Porto Alegre, inaugurou a exposição “Os Trabalhadores do Cinema Capitólio”, um mergulho no universo dos bastidores do cinema gaúcho.
A mostra presta homenagem aos profissionais que garantiram o funcionamento do Cine Capitólio entre 1928 e 1994 — dos lanterninhas e bilheteiros aos operadores de projeção —, a partir de um acervo inédito preservado por Malvina Pianca e hoje incorporado ao patrimônio da Cinemateca.
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A exposição apresenta livros-caixa, folhas de pagamento, fotografias, cartazes e registros administrativos que revelam a rotina dos trabalhadores e suas histórias pessoais. O projeto, financiado pela Política Nacional Aldir Blanc, é uma iniciativa de memória e valorização de categorias profissionais historicamente invisibilizadas.
Bastidores dos velhos cinemas

A curadoria é assinada pela historiadora Alice Dubina Trusz, responsável pela pesquisa que deu origem à mostra. Em entrevista ao Sul21, Trusz destacou que o acervo resgatado é um raro testemunho material da engrenagem humana que mantinha o cinema em operação.
“São dois momentos de consciência patrimonial aí. A pessoa que preserva e depois a quem faz a doação para uma instituição pública, onde os documentos se tornam bens possíveis de ser apropriados por pesquisadores”, explicou.
Os registros foram guardados por Malvina Pianca, filha de Romeu Pianca, proprietário da empresa que administrou o Cine Capitólio entre 1938 e 1967. Malvina trabalhou ao lado do pai na gestão de outras salas de rua, como o Cine Vera Cruz — que mais tarde se tornou o Cine Victória — e o Cinema Ipiranga, na Rua Cristóvão Colombo. Após sua morte, o material foi doado à Cinemateca, tornando-se parte de um acervo público e fundamental para a história do cinema no Rio Grande do Sul.
Profissões extintas
A mostra percorre as profissões essenciais para o funcionamento dos antigos cinemas de rua, apresentando objetos, fotografias e relatos que recriam o ambiente das salas de exibição do século passado.
Entre os destaques estão as funções de bilheteiro, porteiro, cartazista, operador cinematográfico, zelador, gerente, lanterninha e baleiro. Cada uma delas compunha a engrenagem que possibilitava o encontro entre público e filme.

O bilheteiro, por exemplo, foi substituído pelas vendas digitais; o porteiro, hoje chamado recepcionista, mantinha uma relação próxima com o público; e o gerente, além da administração, cultivava vínculos afetivos com os frequentadores. “Principalmente em cinemas de bairro, como era o Capitólio, o gerente conhecia todo mundo. Essa relação humana era uma característica muito forte”, contou Trusz.
As mulheres invisíveis
A pesquisa também trouxe à luz aspectos sociais marcantes da época. Segundo a curadora, os cargos de zeladoria eram ocupados exclusivamente por mulheres — em sua maioria negras e analfabetas. “Elas faziam o trabalho de limpeza, manutenção e apoio, mas seus nomes raramente aparecem nos registros oficiais”, observou.
Nos bastidores da projeção, a mostra revela a rotina técnica e artesanal dos operadores. Na cabine, trabalhavam pelo menos dois funcionários: o operador cinematográfico e o ajudante, responsáveis por lidar com equipamentos de 35 mm, rolos de filme e projetores que exigiam conhecimento em eletricidade e mecânica.
“Hoje, o operador precisa entender mais de informática, mas, naquela época, o domínio era sobre o maquinário, o som e a luz”, explica a pesquisadora. Havia ainda o carregador, encarregado de transportar as latas de filme entre as salas e os armazéns.
Entre o público, atuavam o lanterninha, que guiava os espectadores até seus assentos no escuro, e o baleiro, geralmente adolescentes que circulavam com caixas de doces e refrigerantes. Essas figuras, hoje desaparecidas, eram parte inseparável da experiência cinematográfica.
Os Trabalhadores do Cinema Capitólio
Onde: Cinemateca Capitólio (Rua Demétrio Ribeiro, 1085, Porto Alegre)
Quando: Até 11 de fevereiro de 2026, de terça a domingo
Quanto: Entrada gratuita