Antes de começar a sessão de “Não Sei Viver Sem Palavras”, no Espaço Petrobras de Cinema lotado, o escritor Inácio de Loyola Brandão explicou que sonhou em fazer cinema, mas nunca fez: “Mas vocês não sabem como é estranho ser o assunto de um documentário.”
O cineasta da família calhou de ser André Brandão, um dos filhos do autor de Zero e Não Verás País Nenhum, que logrou a proeza poética de um contra-plongèe emocional e transformou um dos grandes contadores de histórias da língua portuguesa em personagem. Complexo e adorável.
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Se há uma tradição de filmes feitos por filhos ou parentes sobre a vida dos pais – e há –, este, para mim, é o melhor por colocar no centro da história as duas facetas mais essenciais de “Inácio, e não Ignacio”: o operário da palavra e o sonhador.
O filme é a câmera em cima do homem, do escritor andando por suas memórias e seus universos ficcionais, mexendo em gavetas reais ou metafóricas, muitas vezes ao som de trechos de alguns de seus melhores textos, lidos por ele mesmo ou pelo ator Gabriel Braga Nunes, primo do diretor.
Na verdade, quase seria justo creditar Inácio, que foi crítico “para poder entrar de graça no cinema” e fez figurações em O Pagador de Promessas, como coautor, pois há muitas imagens feitas por ele em Super 8 nas casas em que morou em São Paulo ou no período em que viveu em Berlim.
Já na câmera de André, há luz tanto para o singelo e o muito familiar quanto para o olhar reverente ao grande autor. O vovô de sobrancelha grossa e o escritor bem-sucedido poseur na Potsdamer Platz. Intimidade onírica e elegância que são a mesma característica marca da prosa do escritor, jornalista, cinéfilo e observador atento da realidade brasileira.
Se faltava um filme na vida de Inácio de Loyola Brandão, não falta mais. Um daqueles “pequenos grandes”.