Entre as muitas coisas muito bonitas que aconteceram na 33ª edição do Festival de Curitiba, não é exagero dizer que a peça A Velocidade da Luz foi o ponto alto do evento.
O projeto do diretor argentino Marco Canale, que já foi montado em várias partes do mundo, reuniu 26 atores entre 60 e 90 anos, entre profissionais e amadores, que durante um mês criaram uma dramaturgia original a partir das histórias de vida de cada um, que transformou o cotidiano da cidade.
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Quem, como eu, acompanhou a formação e a evolução do grupo, sentiu que a energia potencial daquele encontro não cabia em apenas duas apresentações históricas na Praça Santos Andrade. E o tempo mostrou que não mesmo.
Por um lado, um dos motes da dramaturgia, a criação de uma casa do artista paranaense, parece estar saindo do papel — uma batalha antiga que ganhou visibilidade e tração com a apresentação do espetáculo.
Grupo de Teatro 60+ do Sesi
Por outro, a experiência efêmera do grupo deu origem a um novo coletivo, agora permanente: o Grupo de Teatro 60+ do Sesi.

Segundo Thaisa Bonato, coordenadora de Cultura do Sesi Paraná, o grupo “surgiu de uma proposta de continuidade de um projeto que aconteceu no Festival de Curitiba. A gente oportunizou a continuidade através do nosso projeto Oficinas de Arte”.
Sob a direção do dramaturgo e professor Léo Moita, os encontros e ensaios acontecem todas as terças-feiras, à tarde, no Centro Cultural Sistema Fiep, Unidade Dr. Celso Charuri, no bairro São Francisco, em Curitiba.
Muitos participantes trazem bagagem da montagem anterior; outros estão pisando num palco pela primeira vez.
Projeto coletivo
O texto-base escolhido é Amores Surdos, da dramaturga mineira Grace Passô, adaptado a partir das histórias compartilhadas pelo elenco. A peça, um drama familiar, serviu de espelho para as narrativas pessoais dos participantes e está sendo transformada em uma leitura dramática, um experimento cênico coletivo.
Entre os atores está Marcos Mocochinski, que fez teatro profissional nos anos 1970 e havia se afastado da cena. Retornou ao palco impulsionado por A Velocidade da Luz e, agora, vive sua “segunda encarnação” como ator. Segundo ele, o objetivo é simples: se divertir, conhecer pessoas novas e continuar ativo. “A gente não pode ficar em casa. Há sempre coisas novas a descobrir.”
Tantas emoções
Quem também veio do elenco de A Velocidade da Luz foi Elza Maria Gonçalves, que protagonizou um dos maiores momentos – com direito a dor, tensão e sacrifício – da história do Festival de Curitiba.

Durante a montagem, na Praça Santos Andrade, no centro de Curitiba, ela sofreu uma queda e teve uma fratura no tornozelo.
“Eu acho até que algumas pessoas pensavam que aquilo fazia parte da cena, sabe? Porque eu me vi sentada no chão, aí eu, quando tirei o sapato, o pé estava girado, aí eu quebrei o meu pé. Aí chamaram a emergência.”
Nesse momento, o diretor Canale a consultou se deveria parar o espetáculo, e a atriz disse que não, antes de sair de cena, heroicamente, numa maca, sob a maior ovação da edição do Festival.
“Na maca, eu ainda tive meu momento de glória (risos). Eu não senti dor. Acho que eu tava empolgada, vivendo aquele momento lindo. Foram muitas as minhas emoções. Mas a peça tinha que continuar. Tem que continuar sempre, né?”
Ela conta que está totalmente recuperada: vivendo normalmente, fazendo academia e dançando. Se ficou uma sequela, foi a necessidade de seguir fazendo teatro. “É a coisa mais gostosa que existe: esse encontro para criar arte juntos”, resume.