Por Gabrel Costa, especial para o Fringe
“Nunca julgue um livro pela capa!”
Você provavelmente ouve essa expressão desde muito pequeno — afinal, ela carrega um significado importante: não ter conceitos pré-definidos sobre as pessoas a partir da aparência. Mas, sob um ponto de vista artístico, eu penso diferente. Devemos, sim, levar em conta o design por trás de pôsteres, capas e materiais de divulgação.
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Hoje em dia, no cinema, não é exagero dizer que a arte dos cartazes se perdeu. Na maior parte do tempo, são imagens sem valor artístico, com personagens sobrepostos em composições previsíveis — algo popularizado por franquias como Marvel e Star Wars. Mas houve um tempo em que as coisas eram bem diferentes.

A mostra “Sonhos de Cinema: Arte para a Sétima Arte” apresenta uma seleção de 75 cartazes criados por renomados artistas gráficos cubanos. Com curadoria de Jean-François Couvreur e curadoria adjunta de Jhon Voese, a exposição realizada pelo Museu Oscar Niemeyer pode ser visitada na Sala 11, localizada no subsolo do espaço.
Na Cuba de Fidel Castro, o cinema — e seus cartazes — eram vistos como instrumentos políticos e culturais. Logo após a revolução, em 1959, foi criado o Instituto Cubano de Arte e Indústria Cinematográficos (ICAIC), que desempenhou um papel central na produção audiovisual do país.
Os designers cubanos, à época, tinham liberdade total para criar cartazes a partir de sua própria visão artística, livres da lógica hollywoodiana de se fazer cinema. Segundo Couvreur, os filmes eram reinterpretados de maneira independente, e o grafismo era fortemente influenciado pela Pop Art, pela arte cinética, pela colagem surrealista e pelo psicodelismo. A serigrafia também foi amplamente utilizada — e acabou se tornando uma das marcas mais fortes da cultura gráfica cubana.

Grande parte dos cartazes foi feita inteiramente à mão, o que resultou em texturas ricas, cores intensas e traços autênticos. Entre os artistas em destaque, estão nomes como René Azcuy Cárdenas, Eduardo Muñoz Bachs, Antonio Pérez González (Ñiko) e Antonio Fernández Reboiro.
Para mim, a exposição foi — além de uma imersão na arte cubana — uma oportunidade de repensar a importância das artes gráficas no fazer cinematográfico. Os cartazes deveriam contar uma história, ser capazes de transmitir os sentimentos que envolvem a obra. Cores, formas e traços não deveriam ser aleatórios — como geralmente se vê no cinema de Hollywood.
O clássico Harakiri, de Masaki Kobayashi, por exemplo, teve seu cartaz recriado por Reboiro em uma serigrafia capaz de se comunicar com quem a observa. O francês Truffaut também foi reinterpretado sob olhares cubanos, no pôster de Beijos Roubados, feito por Azcuy.
O público merece mais. No Brasil, também tivemos exemplos marcantes de cartazes entre as décadas de 1960 e 1970. Hoje, no entanto, percebe-se uma certa falta de ousadia — como se o design tivesse perdido o espaço para fórmulas prontas. Deus e o Diabo na Terra do Sol ainda estampa camisetas de apaixonados pela obra de Glauber Rocha, prova de que a imagem também pode se tornar parte da história de um filme.
O design precisa voltar a ser visto como um aliado da narrativa cinematográfica, e não apenas como uma forma de promover os rostos que aparecem na tela.

Se for dado o mesmo espaço para os artistas brasileiros que se deu aos cubanos nos anos 1960 e 1970, teremos um cinema ainda mais rico e diverso.
