Por Gabriel Costa e Sandro Moser
A cantora Beth Carvalho (1946-2019) foi madrinha de muita gente boa do samba. Entre seus afilhados musicais, destaca-se Andrezão do Cacique, compositor, cantor e percussionista que carrega no sobrenome o legado da roda de samba mais importante do Brasil.
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“Não que a roda de samba na rua seja ruim, eu adoro roda de samba, mas a gente precisa preencher os teatros, as grandes casas, os grandes palcos com samba”, disse.
Foi assim que Andrezão agradeceu o convite para se apresentar no tradicional projeto Samba de Bamba, com curadoria do jornalista Rodrigo Browne, na Caixa Cultural Curitiba.
O músico lembrou que era a primeira vez desde a pandemia que ele e seus parceiros de banda tocavam em um teatro. Coincidentemente, a apresentação da última terça (11) aconteceu na noite em que se completaram cinco anos do início do pesadelo da Covid-19.
“É um dia muito especial, na verdade. Eu sou um artista, estou no teatro, estou no palco. Muito obrigado ao Samba de Bamba pela dignidade, pelo almoço digno, pela hospedagem, pela excelente produção”, disse, agradecendo por aquilo que devia ser a regra, mas nem sempre é.
Caciqueando
No palco, Andrezão apresentou biscoitos finos do melhor repertório do gênero. O cantor interpretou brasas de Candeia, com quem guarda semelhança física e espiritual, clássicos da turma do Cacique de Ramos e do Fundo de Quintal, além de sambas das escolas, com destaque para sua amada Mangueira, abrilhantados pela participação especial de Biraney Art Jr., um dos bambas da bateria verde e rosa.
O show também abriu espaço para suas próprias composições. Nos últimos 20 minutos da noite, Andrezão colocou o teatro para “caciquear” e sambar de pé, assim como deve ser.
Corpulento, gentil e humilde, Andrezão cresceu em um covil de bambas. Sereno, Mauro Braga e Zeca Pagodinho eram seus vizinhos na infância.
Cresceu e tornou-se um autêntico partideiro, unindo técnica, divisão e verve. Além disso, é reconhecido pelo talento em um instrumento específico do samba brasileiro: o repique de anel.
Repique de Anel
A relação de Andrezão com o repique de anel remonta à sua infância. Afilhado de Ubirany, criador do repique de mão, teve nesse instrumento seu primeiro contato com a percussão. Com o tempo, aprimorou sua técnica e se tornou referência no repique de anel, criado pelo lendário Dotô.
Antes do show, Andrezão falou ao Fringe sobre sua relação com o peculiar instrumento:
“Volta e meia, as pessoas me consideram referência no instrumento. Eu desenvolvi uma técnica própria a partir do inventor, que foi o Dotô. Desde então, venho buscando formas de aprimorar a sonoridade do repique de anel. Esse instrumento me levou para o mundo inteiro”, disse, enquanto emulava com os anéis os sons de uma bateria completa.
Um som tão bonito que o próprio artífice se admirou. “Eu costumo dizer que esse som é tão natural para o samba… Parece um conjunto de tamborins cantando no fundo. É o samba inteiro resumido aqui.”