“Preservar as narrativas orais é preservar a memória e a história da humanidade”, diz a escritora Avani Souza SIlva sobre seu livro Nós Também Falamos Português, que reúne lendas, contos e fábulas dos nove países integrantes da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

Lançada pela Editora Martin Claret, a obra é resultado de pesquisas de Avani sobre a oralidade presente nas regiões de língua portuguesa e de consultas a antropólogos, folcloristas, missionários, professores e pesquisadores do idioma. As ilustrações do livro são de Thales Fernando.

Autora de outras duas obras A África Recontada para Crianças e A Ásia Recontada para Crianças, Avani é formada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, onde também fez mestrado e doutorado na área de Literaturas da Língua Portuguesa. Em Nós Também Falamos Português, a escritora se dirige novamente ao público infantil para aproximá-lo do imaginário popular dos países lusófonos.

Apesar do idioma em comum, os países estudados por Avani para a reunião das histórias pertencem a diferentes continentes e apresentam distinções culturais profundas entre si. Da África, são retratadas histórias de Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Guiné Equatorial, Angola e São Tomé e Príncipe; da América, os contos vêm do Brasil; da Europa, de Portugal; e da Ásia, do Timor-Leste.

Aluna de uma escola em Moçambique. Foto: Reprodução/Gorongosa Park

Os temas e lições de moral que percorrem as páginas de Nós Também Falamos Português são apontados como necessários aos alunos do ensino fundamental, como lembra Avani. Por meio de personagens como o Monte Grito, o Ti Lobo e a Dona Onça – que assumem características humanas e enfrentam conflitos –, o público infantil recebe ensinamentos e pode exercitá-los na vida cotidiana. “Os animais sempre finalizam as histórias com alguma sabedoria. A ficção nos leva a uma reflexão sobre o real”, enfatiza a escritora.

Dentre as discussões tratadas nas histórias reunidas no livro estão a justiça, os direitos humanos, a valorização do conhecimento dos mais velhos e, especialmente, a pauta antirracista. Avani lembra que o combate ao racismo integra a agenda pública brasileira e que, nesse combate, o ensino da história e da cultura dos povos africanos é indispensável.

“O movimento negro sempre lutou para que a importância da África na construção do nosso País fosse ensinada às crianças sob um olhar antirracista”, destaca a escritora. Desde 2003, a Lei 10.639/03 prevê a obrigatoriedade da temática História e Cultura Afro-Brasileira nas disciplinas das grades curriculares da educação básica nas redes pública e privada. “Com a Lei, os alunos passam a aprender mais sobre a contribuição da população negra nas áreas social, política e econômica”, complementa Avani.

Além do estudo da literatura e cultura dos países de língua portuguesa, Avani teve nas histórias contadas por sua mãe e sua avó a principal inspiração para o livro. A escritora destaca o contato com narrativas orais na infância como um meio essencial para o desenvolvimento de habilidades cognitivas e a formação de futuros leitores ativos. “Contar histórias para crianças as auxilia na elaboração do pensamento, da expressão por meio da fala e da autopercepção no mundo”, explica.

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A escritora aponta ainda a riqueza cultural presente nos relatos orais, que circulam entre diversos espaços e sofrem modificações. Embora seu livro apresente duas histórias para cada país abordado, Avani reitera que as narrativas não pertencem a nenhum território específico, mas atravessam fronteiras e ganham particularidades em cada região falante da língua portuguesa.

Atualmente, segundo o Instituto Camões, o português é a quarta língua materna mais falada no mundo, com cerca de 260 milhões de falantes. Além dos nove países que integram a CPLP, Macau, região autônoma da costa sul da China, também tem o idioma como oficial.

A grande dispersão da língua portuguesa pelo mundo se deu pelas expansões marítimas de Portugal entre os séculos 15 e 18. Ao colonizarem diferentes territórios, os portugueses instituíram seus próprios métodos de organização e convívio entre as populações nativas e disseminaram seu idioma.

Nós Também Falamos Português, de Avani Souza Silva, Editora Martin Claret, 144 páginas, R$59,90

Texto: Mirela Costa publicado no Jornal da USP

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