Chega a notícia da morte, aos 82 anos, do grande compositor e instrumentista Jards Macalé, e eu dou um grito. Ao que consta, ele estava internado tratando um enfisema pulmonar e sofreu uma parada cardíaca.
Na última vez que o vi, numa noite bastante fria no Festival Paulo Leminski, ele estava resfriado — o que não o impediu de fazer mais um show inesquecível.
Macalé, que entrou na música pelo teatro – como violonista do Grupo Opinião – ganhou o apelido de um jogador de qualidade duvidosa do time do Botafogo.
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Porém, com o violão nas mãos, para mim, ele foi o craque maior de sua geração. Criou uma música totalmente original unindo os batuques do morro ao som das brasileiro das orquestras, da bossa nova e dos violões brasileiros.
Compôs as melhores canções de seu tempo, sozinho ou com parceiros. Com Capinam e Waly Salomão, fez hinos da contracultura brasileira. Foi ator no meu filme preferido dos anos 1970, O Amuleto de Ogum, de . Foi arranjador e produtor do melhor álbum de Caetano Veloso, Transa, de 1972.
Correu o Brasil com Moreira da Silva, apresentando o velho Kid às novas gerações. Era doce, irreverente, engraçado, ousado e genial.
Com suas calças brancas, seu casaco e All Star vermelhos e seu violão, sentou-se à frente de uma formidável banda formada por cinco instrumentistas mulheres.
Juntos, eles passaram por quase todas as ruas da obra de Macalé, em especial pelo repertório de seus últimos dois álbuns (formidáveis, diga-se): Besta Fera e Coração Bifurcado.
Nos últimos dez anos, Macalé produziu e gravou discos premiados e elogiadíssimos, participou de projetos interessantes, fez parcerias com artistas de gerações diferentes e conquistou um público novo.
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Antes do show, em entrevista para o Fringe, Macalé disse que a poesia sempre foi o único caminho:
“[A poesia] pode salvar-nos da mediocridade, da inutilidade, da pobreza das linguagens. Pode ser uma espécie de salvação”, disse.
E falou também sobre o que o movia. “Continuar criando é a minha saída; no caso, a minha estrada na vida”, ele disse.
Jards Macalé é a “besta fera” da música brasileira, e seu álbum homônimo de 1972 é tão bom quanto o melhor disco já feito no Brasil.

